OTTO SANCHEZ-CRESPO DA ROSA

Esta dissertação de mestrado analisa a filosofia da técnica de Jacques Ellul a partir do primeiro e mais conhecido livro de sua trilogia de filosofia da técnica, a obra La technique ou l’enjeu du siècle, de 1954. Considera-se o centro de sua argumentação a ideia de que, na modernidade, as operações técnicas passam a ser selecionadas a partir do cálculo de eficiência máxima, isto é, o cálculo feito por técnicos, de tipo entrada-saída (input-output), de preferência quantificado, com o objetivo de que o meio escolhido efetive na realidade a maior razão entre output e input. Partindo da introdução de máquinas na produção e da racionalização do Estado, o cálculo de eficiência máxima é aplicado progressivamente em todos os campos da atividade humana. Como consequência dessa aplicação generalizada, as operações técnicas fundadas sobre o cálculo de eficiência máxima passam a formar um conjunto com características próprias – o fenômeno técnico – que, por sua vez, modifica profundamente todos os aspectos da sociedade e os indivíduos. Para o autor, o fenômeno técnico adquire autonomia, isto é, impõe-se à sociedade e aos indivíduos, na medida em que, por um lado, a efetivação dos interesses econômicos e políticos se torna dependente do progresso técnico e, por outro lado, os próprios indivíduos passam a valorizar o progresso técnico como um fim em si mesmo. A autonomia do fenômeno técnico leva, então, ao determinismo, uma vez que ele tende a se impor a todos os campos da atividade humana. Em vista da discussão erigida por intérpretes como Ferkiss, Feenberg, Alexander, Cérézuelle, L. Marx & H. Smith, Porquet, entre outros, sobre o caráter desse determinismo, assume-se se tratar de um determinismo de tendência fatalista, seja porque o fenômeno técnico adquire uma autonomia que parece irreversível – pelo autocrescimento acelerado do progresso técnico e pelos efeitos imprevistos (consequências não intencionais) causados por aplicações técnicas, que exigem novos desenvolvimentos técnicos para sua solução –, seja porque não há expectativa de que os indivíduos e as instituições deixem de valorizar o progresso técnico. Dessa forma, a obra de Ellul adquire relevância no debate contemporâneo em filosofia da técnica, dada sua ênfase na forma como o progresso técnico diminui a capacidade de decisão dos indivíduos sobre o rumo das técnicas e da sociedade. Trata-se de perceber como, evidentemente, a sociedade mesma valoriza o progresso técnico, mas também como o progresso técnico solapa a possibilidade de alternativas, como as técnicas tradicionais ou em desuso, fora do cálculo da eficiência máxima.