Programação
O objetivo desta palestra é apresentar, por meio de uma reconstrução da trajetória teórica de Nancy Fraser, a centralidade que a política e a teoria social desempenham em sua teoria crítica do capitalismo. Para isso, parto de uma análise daquilo que Fraser compreende por teoria crítica, e qual o lugar que a autocompreensão das lutas da época possuem nela. Em seguida, passo por cada um dos três momentos de sua produção. Primeiro, apresento o modo como Fraser compreende as lutas feministas e antirracistas nos anos 1980, isto é, como lutas pelas necessidades, isto é, disputas políticas a respeito da interpretação de quais são as necessidades que devem ser satisfeitas e de como elas devem ser satisfeitas. Mostro, então, que, para Fraser, essas disputas surgem no contexto de um capitalismo administrado pelo Estado – que se caracteriza pelo surgimento do social e pela politização da economia, do pessoal e do doméstico – e devem ser compreendidas como lutas de fronteira em cujo horizonte estaria um socialismo democrático que leva em consideração as dimensões de raça, classe e gênero. Em seguida, passo à análise de trabalhos publicados por Fraser entre os anos 1990-2000, período caracterizado pela consolidação de uma hegemonia neoliberal progressista que deslegitima as lutas por necessidades, reprivatizando a economia e o doméstico/pessoal, e esvaziando o domínio do social. Mostro, então, que, para Fraser, o que explica essas transformações no vocabulário político é o ressurgimento de um liberalismo econômico globalizante, no qual a economia é reprivatizada e avança tanto sobre a esfera do pessoal/doméstico quanto sobre a política, cujo escopo é reduzido. É a esse cenário que a autora se contrapõe ao problematizar o recuo político do imaginário pós-socialista, e de grande parte dos movimentos feministas, e passa a enfatizar a necessidade de repolitização da economia com o objetivo de corrigi-lo. Analisando, por fim, os textos publicados por Fraser após 2007-8, procuro mostrar como a crise altera esse cenário ao provocar rachaduras no discurso neoliberal, que começa a perder sua hegemonia. Nesse contexto, o espaço para a política se amplia novamente e as lutas de fronteiras voltam a surgir. Mostro, então, que, para Fraser, esses novos desenvolvimentos políticos podem ser explicados por uma teoria multidimensional das crises cujo ponto de partida é uma compreensão do capitalismo enquanto ordem social institucionalizada. Por fim, defendo que, para Fraser, as lutas de fronteira, que muitas vezes assumem uma feição conservadora, só se tornam efetivamente transformadoras quando escapam de uma postura meramente defensiva e buscam redefinir democraticamente as fronteiras, enquanto lutas de classe.