Pierre Aubenque (1929-2020)

O Departamento anuncia, com grande tristeza, o falecimento do prof. Pierre Aubenque, ocorrido em 23 de Fevereiro de 2020. Pierre Aubenque foi um dos grandes intérpretes da filosofia de Aristóteles em língua francesa. Em 1962 publicou a sua tese principal de Doutorado de Estado, O Problema do Ser em Aristóteles (2012; tradução de Cristina Agostini e Dioclézio Faustino); no ano seguinte, é publicada sua tese complementar, A Prudência em Aristóteles (1963; tradução brasileira de Marisa Lopes em 2008; resenhado em https://www1.folha.uol.com.br/fsp/resenha/rs1303200405.htm). Ambos os livros têm uma forte influência de Heidegger, de quem Aubenque era um grande conhecedor. No primeiro, Aubenque insistiu na ideia que a metafísica era inacabada porque inacabável (daí seu interesse sobre a natureza da aporia e da dialética em Aristóteles); no segundo, pôs em evidência a função do prudente na determinação da ação correta no meio da circunstancialidade e da variabilidade em que ocorre a ação humana (donde seu interesse pela marca trágica do ato humano). Quando se tornou professor em Paris IV, passou a dirigir o Centro Léon Robin, tornando-o um centro de referência internacional, por onde passaram os mais importantes pesquisadores da filosofia de Aristóteles da época. Aclamado internacionalmente, era um leitor extremamente arguto e sensível, capaz de dar a expressões correntes da língua francesa um súbito estatuto metafísico. Fluente em diversas línguas (em especial no alemão), nunca cedeu às tentações de uma língua franca, pois via, como filósofo, uma conexão íntima entre reflexão e língua natural. Professor generoso, recebia com extrema cordialidade os jovens pesquisadores e doutorandos que se apresentavam em Paris IV. Em seus últimos cursos na Sorbonne, ao citar Heidegger certa vez, viu um aluno retirar-se da sala em protesto; fez então uma defesa da potência filosófica do pensamento heideggeriano, ao mesmo tempo em que reconhecia o lado sombrio da pessoa de Heidegger. Pierre Aubenque foi um dos grandes intelectuais franceses da metade final do século passado, representante por excelência de um estilo de erudição e análise filosófica cuja profundidade e elegância a atual atarefada filosofia acadêmica, obcecada com artigos e citações Google, mal é capaz de reconhecer.