Programação
"Se a crítica tradicional da ideologia contava com a eficácia subversiva da própria ideologia burguesa, que afirmava o valor universal da igualdade e da liberdade negado na prática, as coisas mudam de figura quando o empuxo transformador assegurado pela dialética entre forças produtivas e relações de produção é neutralizado pelo capitalismo administrado. Este último, na avaliação subscrita por Habermas, incorpora e dilui o potencial de negação da luta de classes por meio da integração do proletariado no Estado de bem-estar social. Isso não apenas afasta qualquer ideia de revolução, como, por tabela, põe na pauta o desafio de refletir sobre o peso que a racionalidade burocrática passa a exercer sobre os agentes sociais. O tema da alienação e da reificação, tão caro ao hegelianismo marxista, é então informado pela colonização do mundo da vida pelas esferas do poder e do dinheiro.
Esses são os dois fatores que, destituindo a dialética marxista de seu desenlace prometido, acarretaram orientações divergentes na constelação frankfurtiana. De um lado, Adorno, revertendo no plano crítico-conceitual os benefícios suprimidos na práxis, sofisticou a crítica da mercadoria no quadro de uma dialética negativa, com as conhecidas implicações para a abordagem da arte e da cultura de massas. Em contrapartida, Habermas, levando adiante o compromisso com a transformação efetiva do campo social, não renunciou a buscar novas fontes normativas, aptas a medir retrocessos e conquistas no terreno movediço da atualidade." (Vinicius de Figueiredo, Prefácio)