MARIANA DI STELLA PIAZZOLLA

Curso
Mestrado
Título da pesquisa
Hospitalidade oferecida pelas lágrimas da cega: Jacques Derrida e a habitação do feminino
Resumo da pesquisa

Que o feminino participe da noção de hospitalidade nas obras de Jacques Derrida não é mero acaso, apesar de nem sempre ser considerado. Talvez isso se deva à invisibilidade que o caracteriza. Trata-se, como diz o filósofo, de uma hipótese suplementar. Assim, antes de constituir uma contingência cultural, o feminino é alçado à condição de (im)possibilidade. Fazendo-se, portanto, como sustentáculo do que é deixado de fora. Desse modo, busca-se compreender tal posição em consonância com sua aporia. Para tanto, em primeiro lugar, mostra-se como nos seus primeiros trabalhos, Derrida desconstrói a constituição da subjetividade husserliana, denunciando uma abertura na fenomenologia quando esta parecia fechada ao outro. Essa interrupção do sujeito que se afirmava em presença conquistando as propriedades por uma visão do mundo, revela antes, um cego, que tem a capacidade de receber o outro. Por sua vez, este é deslocado para a cegueira da mulher num movimento que não realiza uma simples inversão, pois depende de uma noção de temporalidade na qual passado-presente-futuro se dobram num instante: tempo messiânico. Em seguida, ao analisar essa subjetividade que teve sua visão sacrificada, percebe-se que ela transcende ao passado imemorial, posto que é perseguida por uma alteridade que demanda compartilhamento de suas propriedades. Nesse sentido, perdê-las passa a ser uma necessidade para receber o outro, por isso Derrida compara as subjetividades de Levinas e Pascal. Nessa tradição, encontrou-se uma suplementariedade da visão, na qual a cegueira externa é substituída pelos olhos do coração, cuja operacionalidade daria acesso ao rastro do Infinito no Rosto de Outrem. Sendo assim, uma visão permaneceria, porque antecedida pelo choro agostiniano. A suplementariedade do feminino vem, então, suplementar a visão do cego que vê a luz sobrenatural. Ela está nas lágrimas associadas à sensibilidade da mulher, que não deixam os olhos externos nem ver nem deixar de ver. Com isso, o feminino passa à condição de impossibilidade da hospitalidade: é preciso ser cega chorosa para receber Outrem. Segue-se desse deslocamento da razão à sensibilidade, a necessidade de se discutir como a mulher e feminino se articulam no acolhimento. Derrida, ao ler as obras de Levinas, oferece duas leituras que se distinguem pela associação "das mulheres empíricas de fato" à hipérbole androcêntrica, e do "ser feminino" à hipérbole feminista. A primeira leitura acusa as privações que as mulheres sofrem como alteridade que sustenta uma ética da qual não lhes é permitido participar. Elas são sacrificadas, tal como as bruxas, para que os homens possam (con)fraternizar. Nessa interpretação, o acolhimento é tratado como trabalho, cujas demandas por visibilidade se alocam nas estratégias em voga pelo fim da subordinação das mulheres. Mas existe uma outra leitura possível para aquela que é sensível em oposição ao inteligível (chorosa), que não tem acesso à intuição de essência em contraposição ao vidente (cega), aquela que deve ser sacrificada em oposição ao que transcende (bruxa): o Manifesto Feminista. Este deve assumir a invisibilidade de um feminino enquanto tempo messiânico que retorna, sem reproduzir as mesmas situações de opressão, para trazer, com a novidade, a libertação.

Orientador
Sérgio Cardoso
Fomento
CAPES
Data da defesa
11/12/2023