JOSÉ GUILHERME PEREIRA LEITE

Em 1989, pouco antes do Novo Milênio, Francis Fukuyama provocou a comunidade filosófica falando em Fim da História e Fim da Arte. A Arte, para ele, perderia sua negatividade, dissolvendo-se nos modos homogêneos de uma universalidade inédita, criada pelo triunfo do capitalismo liberal. O que houve de fato, então? O caráter anti-societal da produção artística acirrou-se, em linha com o agravamento das crises. O fim-do-mundismo e o Kulturpessimismus que agora nos assolam são contrafaces da hipertelia técnica, sintomas de um capitalismo que reina economicamente sem legitimidade cultural.
Recorrendo à análise interna de obras, procuramos identificar as estruturas elementares desse fim-do-mundismo, buscando suas recorrências e matrizes simbólicas. Assim, entram em cena escritos de J. M. Coetzee, filmes de Stanley Kubrick e Alfonso Cuarón, exemplares da cinecatástrofe recente, trash movies e animações, canções de Gilberto Gil, trabalhos de Giuseppe Penone e Pierre Huyghe, a linha curatorial de Carolyn Christov-Bakargiev para a dOCUMENTA(13) – com diversos de seus participantes –, a ópera Amazonas de Peter Weibel e projetos de arquitetura realizados por Anne Lacaton, Jean-Philippe Vassal e Frédéric Druot.
Essa análise procura paralelos entre as obras e um clima conceitual de época, fundado na denúncia de um “capitalismo creôntico” – expressão de cunha nossa – explorando essa hipertelia e as disjunções agravadas entre política e emancipação. Autores como Herbert Marcuse, Jean Baudrillard, Gilles Deleuze, Christopher Lasch, Milton Santos, Hermínio Martins e Beatriz Sarlo são convocados por nós, nessa caixa de ressonâncias, juntamente com seguidas remetências ao pensamento de G. W. F. Hegel – filósofo implicado por Fukuyama em suas proposições teleológicas e absolutizantes. Hegel aparece também na medida em que suas ideias estéticas sobre o caráter reflexivo da Arte nos parecem cada vez mais atuais, e não o contrário.